A Casa e a Cor de Minas

O CASACOR em Minas Gerais completa 17 anos de exibição dos trabalhos de arquitetos, designers de interiores, designers de produto e inovação tecnológica para ambientes. O sucesso de um dos mais importantes eventos do gênero no Brasil se deve em parte ao know-how dos profissionais mineiros, que há mais de meio século recebem formação de alta qualidade na área, e parte ao jeitinho mineiro de se ocupar dos detalhes que fazem toda a diferença.

O mineiro é diplomata por natureza. Mediador entre várias regiões do Brasil e suas diversidades culturais, uma das características mais marcantes de Minas é a hospitalidade. E visitar o CASACOR é como ser convidado para o clássico cafezinho na casa de vários mineiros com muito estilo.

A maioria dos projetos são pensados para personagens que ganham vida na imaginação dos criadores e conferem aos ambientes uma personalidade direcionada, fugindo da frieza do design que ainda não pertence à ninguém. Na CASACOR conhecemos onde vive o enólogo, o jovem independente, uma decoradora, uma jornalista, uma cantora, uma campeã de golfe, um casal de meia idade que ama viajar e até um governador e um presidente. Todos abrindo seus espaços íntimos para receber dezenas de pessoas todos os dias.

Até a bilheteria, uma espécie de recepção atemporal para as várias visitas à personagens, estilos e épocas que estão por vir, já oferece “statements” bem diferentes da sala de recepção do seu médico ou dentista: uma textura geométrica colore de azul a parede de fundo, que serve de apoio para uma tela abstrata nos mesmos tons. O design de Mariana Borges e Thaysa Godoy apresenta um padrão que se repete por outros ambientes e o ritmo é equilibrado entre “less is more” e ”less is bore”, com a influência do design escandinavo e a convergência entre o internacional e o local sem medo de ser feliz.

O casal de meia idade imaginado por Natacha Nascif e Juliana Couri, por exemplo, exprime bem a importância dos objetos do mundo, designs globais, integrados à personalidade e a histórias individuais.  Chamado de Hobby, o ambiente desse casal elegante, viajado, descolado, inteligente e cheio de amor brinca com texturas de superfícies e preenche uma estrutura completamente moderna com objetos de culturas ancestrais e lembranças de aventuras passadas.

Interessante notar também que muitos destes personagens do mundo utópico do design, que têm como base tendências contemporâneas de pensamentos e vontades reais, estão também livres para brincar com o tempo. E agora o design modernista, referência dos anos 60 e 70 e um pouco de um olhar retrô aos recentes office-lofts dos anos 90 são preferências que se repetem.  O enólogo, o presidente e o rapaz são exemplos dessa viagem no tempo. Ambientes que às vezes parecem um cenário de “Mad Man” adaptado às necessidades de hoje. Flávia Pereira, “mãe” do rapaz apesar da pouca idade, dividiu em um espaço bem limitado, objetos atemporais que dividem áreas e formam um apartamento aconchegante e útil. O rapaz é independente, sabe o que quer e não se preocupa em aproveitar sua banheira enquanto conversa com o amigo rebelde da tradicional família mineira  que herdou apenas as pratarias (feliz do moço).

O enólogo minimalista é rico, muito rico, e por isso não precisa de muito. Os objetos do seu living, idealizado por Angélica Araújo, refletem uma preocupação muito importante: o design ecológico. Para tanto o ambiente é cercado de pisos e tecidos de fibras ecológicas e transborda luxo. Limpo, na vista, no corpo e na alma. A preocupação ambiental se reflete na escolha de materiais como luz de led e pisos de madeira eco-friendly, que podem ser encontrados também na suíte presidencial de Juliano Vasconcellos e Carlos Maia. O ambiente nos deixa suspensos no espaço e no tempo: camadas são sobrepostas e as cores quentes, aconchegantes e austeras flutuam por entre perspectivas e jogos visuais que misturam o antigo e o novo (ou muito novo). Destaque para a tela de projeção que recebe imagens em ambos os lados com a mesma definição.

A tecnologia é uma via de regra para os novos habitats e o vidro do box que muda de textura por comando sensível é de cair o queixo. O artefato que passa de transparente a opaco quando alguém se aproxima é parte de uma suíte, que dessa vez foi inspirado em uma personalidade real. Celeno Ivanovo e Luiz Henrique Ribeiro se inspiraram no atual Governador de Minas para construir uma suíte que acolhe um jogo de cores bem clássico, formas e objetos modernos interessantíssimos, todos produzidos em território nacional (como a luminária de cerejas pretas absurda da La Lampe!).

Passeando pelos vários espaços que brincam com cores, atitude, texturas e performance tecnológica conhecemos novos personagens interessantes, como nossa mais nova amiga de infância, a campeã de golf. Não somente uma sumidade do esporte, arrasa nas produções, no modo de viver a vida e na audácia tecnológica. Imagine a Cher de As Patricinha de Beverly Hills que cresceu, aprendeu a jogar golfe, amou, se profissionalizou – mudando-se pra Belo Horizonte –  e virou uma mulher independente com muitas faces. O closet giratório é controlado por um iPad, onde ela pode escolher um dos seus vários Victor Dzenk e ainda ser avisada de quando, como e onde utilizou a peça no passado.  Aliás, o iPad é o melhor amigo de nossa golfista, que controla a luz, o clima do ambiente, o canal e a posição da tv, que circula em um trilho pelo teto (tá?!). Cristina Morethson e Ângelo Coelho foram extremamente simpáticos ao nos apresentar seu loft, explicando cada detalhe, extasiados com o dinamismo de seu Frankenstein luxuoso. Parabéns!

Mas nada como a predileção de muitos designers pelo espaço de banho. Ambientes inteiros dedicados ao banho foram executados e expressam a importância de momentos dedicados a si, à privacidade do bem estar nos dias de hoje. A sala de banho de Christiane Taranto é um spa em casa, pra quem pode. E mais uma vez o design escandinavo, o aproveitamento de espaços e um toque de romantismo estão juntos. Harmonia e o prazer da limpeza.

Com a alma lavada, quem visita o CASACOR sai com a certeza de que uma feira de design de interior nem sempre apresenta somente ambientes impessoais e assépticos. Fora alguns poucos casos de apego à cultura do pão de queijo e ao over-done estilo Jequitinhonha-chic, os mineiros que se dedicaram a dar vida aos ambientes pensaram em fazer emergir o melhor da produção local em ambientes que se adaptam à vida na cultura global com muita inovação. Bem sabemos que a individualidade e o valor de características peculiares locais é cada vez mais valorizada, mas os designers mineiros, como bons anfitriões que são, sabem que o design também é feito para ser vivido, no dia a dia de um mundo que apesar de multi-cultural e extremamente dinâmico não apaga o desejo de pertencimento e a vontade de ter tempo pra tomar um cafezinho, “prosear” ou relaxar no banho.

GREGORIO REIS
gregorioreis@brrun.com

Fotos: Paulo Raic © Copyright 2011 – BRRUN.COM